Parecer eleitoral sobre uso da imagem do Ex-Presidente Luiz Inácio da Silva - LULA
PARECER
Trata-se de questão formulada pelo Diretório Estadual do Partido Trabalhista Brasileiro - PTB sobre a possibilidade de participação, na propaganda eleitoral para a disputa ao Governo do Estado de Pernambuco, do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva e da Sra. Dilma Rousseff, como também dos demais candidatos e militantes filiados aos partidos integrantes da coligação de nível estadual.
Ocorre que o PTB celebrou em nível nacional coligação com o Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB para a disputa à Presidência da República, apoiando o Sr. Aécio Neves. E, em nível estadual, o PTB se prepara para lançar candidato próprio ao Governo do Estado de Pernambuco, o Sr. Armando Monteiro, com apoio do Partido dos Trabalhadores – PT.
A dúvida existente consiste no fato de que como em nível nacional o PTB e o PT encontram-se em lados opostos na disputa à Presidência da República, seria possível nas eleições estaduais que os candidatos e filiados do PT participem da propaganda eleitoral para a disputa ao Governo do Estado de Pernambuco?
DA VERTICALIZAÇÃO PARTIDÁRIA
No ano de 2002, o Tribunal Superior Eleitoral, efetuou uma interpretação da Lei nº 9.504\97 no seguinte sentido: em virtude do caráter nacional dos partidos políticos, os posicionamentos tomados pelo órgão nacional deverão ser seguidos pelos órgãos estaduais e municipais.
Segue os posicionamentos da Corte Superior Eleitoral:
“Consulta. Coligações. Os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de presidente da República não poderão formar coligações para eleição de governador de estado ou do Distrito Federal, senador, deputado federal e deputado estadual ou distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato à eleição presidencial. Consulta respondida negativamente.”
(Res. nº 21.002, de 26.2.2002, rel. Min. Garcia Vieira.)
“Verticalização. A verticalização é conducente à observância, na base, da coligação feita a nível nacional.”
(Res. nº 22.242, de 6.6.2006, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, red. designado Min. Marco Aurélio.)
Com isso, a verticalização partidária obrigava aos partidos políticos a manter a coligação partidária efetuada em nível nacional, para os níveis estaduais e municipais.
Isto é, caso ocorresse a formação de uma coligação para as eleições presidenciais, esta deveria ser mantida para a disputa dos cargos de Governador, Senador, Deputado Federal, Deputado Estadual e Deputado Distrital.
Tal posicionamento fora seguido nas eleições de 2002, onde as coligações de nível nacional foram observadas nos estados.
A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 52 de 2006.
O Texto Constitucional, antes da Emenda Constitucional nº 52\06 detinha, no seu artigo 17, § 1º a seguinte redação:
É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir a sua estrutura interna, organização e funcionamento, devendo seus estatutos estabelecer normas de fidelidade e disciplina partidárias.
Com base nessa redação, principalmente contaminado pela expressão “fidelidade partidária”, o Tribunal Superior Eleitoral entendeu que imperava no ordenamento pátrio a ideia de verticalização partidária.
Contudo, tal posicionamento nunca fora coletivo, havendo vozes extremamente contrárias. Tais vozes operaram a tramitação no Congresso Nacional da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 548/02) que objetivava acabar com a obrigatoriedade de verticalização das coligações eleitorais, a qual conforme fora referido decorria de uma interpretação do Tribunal Superior Eleitoral.
Assim, fora aprovada a Emenda Constitucional nº 52, que modificou a redação do parágrafo primeiro de artigo 17 da Constituição Federal, passando a ter a seguinte redação:
Constituição Federal. Artigo 17, § 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.
Dessa forma, o debate anteriormente existente fora devidamente ultrapassado, de modo que fora operado o fim da verticalização, por meio da modificação da redação da norma constitucional.
Partindo deste novo direcionamento normativo, o Tribunal Superior eleitoral passou a se pronunciar no seguinte sentido:
“Consulta. Partido Social Liberal. Verticalização das coligações político-partidárias. Fim da obrigatoriedade. Art. 17, § 1º, da Constituição Federal. Incidência a partir da eleição de 2010. 1. A obrigatoriedade de verticalização das coligações, que se fundamentava no princípio do caráter nacional do partido, foi mantida somente para as eleições de 2006 (ADIN nº 3.685-8/DF, Relª. Minª. Ellen Gracie, DJ de 10.8.2006 e § 1º do art. 3º da Res.-TSE nº. 22.156/2006). 2. O art. 17, § 1º, da Constituição, alterado pela EC 52/2006, assegura aos partidos políticos autonomia para 'adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária'. 3. A nova redação do art. 17, § 1º, da Constituição Federal, dispondo acerca do fim da obrigatoriedade da verticalização das coligações político-partidárias, incidirá sobre as eleições de 2010, segundo interpretação do STF na ADIN nº 3.685-8/DF (Relª. Minª. Ellen Gracie, DJ de 10.8.2006). Para as eleições de 2010 não há obrigatoriedade de verticalização partidária. [...].”
(Res. nº 23.200, de 17.12.2009, rel. Min. Felix Fischer.)
Nesses termos, através da renovação trazida pela Emenda Constitucional nº 52 de 2006, o referido dispositivo constitucional deu total autonomia aos partidos políticos no processo de formação de suas coligações partidárias.
Com isso, poderá ocorrer a formação de uma coligação para a disputa de cargos em nível nacional e outra coligação pra a disputa de cargos em nível estadual e municipal.
Passando o disposto para o caso em apreço, mesmo que o PTB não se coligue com o PT em nível nacional; não há qualquer vedação para que o PT integre a coligação formada pelo PTB para a disputa dos cargos ao Governo Estadual, Senado Federal, Câmara Federal e Assembleia Legislativa Estadual.
DO DISPOSTO NO ARTIGO 6º DA LEI 9.504\97
A coligação consiste na junção – temporária – de várias agremiações partidárias, a fim de buscarem conquistas eleitorais1. A reunião pode ocorrer em relação às eleições majoritárias, às proporcionais ou em ambas.
Para dar início ao estudo da temática ora abordada, é mister a análise do texto normativo do artigo 6º da Lei n° 9.504/1997:
Art. 6º É facultado aos partidos políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária, proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação para o pleito majoritário.
O citado dispositivo normativo caminha - como não poderia ser diferente - no mesmo sentido da norma constitucional já debatida. Conforme fora grifado, as coligações eleitorais deverão ser formadas dentro da mesma circunscrição.
O Código Eleitoral, em seu artigo 86 entende como sendo circunscrição:
Código Eleitoral. Art. 86. Nas eleições presidenciais, a circunscrição serão País; nas eleições federais e estaduais, o Estado; e nas municipais, o respectivo município.
Assim, a sistemática eleitoral encontra-se dividida em três circunscrições: uma nacional, uma estadual e outra municipal2. Devendo as coligações também seguirem esses três níveis, desse modo o Diretório nacional do PTB poderá formar uma coligação para a disputa ao cargo de Presidente da República, a qual não terá obrigatoriamente nenhum vínculo com as determinações dos diretórios estaduais; podendo – em nível estadual – ser formalizada coligação deferente da celebrada para o nível nacional, haja vista que se tratam de circunscrições eleitorais diferentes.
Compartilhando o mesmo entendimento, Roberto Amaral e Sérgio Sérvulo lecionam que:
“À autonomia das unidades corresponde a autonomia dos órgãos regionais dos partidos políticos. As unidades federadas têm autonomia, portanto, possuem circunscrições próprias, a circunscrição municipal, a circunscrição estadual e a circunscrição nacional, que não é a soma das circunscrições estaduais. A cada circunscrição corresponde uma coligação, é o que dita o artigo 6º da lei nº 9.504\97, que, aliais, simplesmente obedece à regra do artigo 86 do código eleitoral”3.
O âmbito das coligações será a circunscrição eleitoral a qual o cargo encontra-se em disputa, não havendo interferência entre as circunscrições.
DA POSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO DECANDIDATOS E MILITANTES INTEGRANTES DE COLIGAÇÕES DIFERENTES EM CIRCUNSCRIÇÕES DIFERENTES
Finalizado o debate sobre a possibilidade de formalização de coligações em circunscrições distintas, passa-se a análise sobre a participação de candidatos e militantes integrantes de coligações opostas em nível nacional, porém – em nível estadual – pertencentes a mesma coligação.
Primeiramente analisar-se-á os fundamentos legais, para em seguida, passar ao estudo dos posicionamentos jurisprudenciais.
Segundo reza o artigo 54 da Lei 9.504\97:
Art. 54. Dos programas de rádio e televisão destinados à propaganda eleitoral gratuita de cada partido ou coligação poderá participar, em apoio aos candidatos desta ou daquele, qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido integrante de outra coligação, sendo vedada a participação de qualquer pessoa mediante remuneração.
Conforme expressamente dispõe o referido artigo, as coligações formalizadas em âmbito estadual autorizam que todos os candidatos ou militantes integrantes dos partidos coligados possam participar da propaganda eleitoral. 4
Apreciando a Consulta nº 647-40\2010, na sessão de 12 de agosto de 2010, o Tribunal Superior Eleitoral se pronunciou da seguinte forma:
CONSULTA. CONHECIMENTO PARCIAL. ART. 45, § 6º, DA LEI DAS ELEIÇÕES. VERTICALIZAÇÃO DA PROPAGANDA ELEITORAL. IMPOSSIBILIDADE.
I - A interpretação do art. 45, § 6°, da Lei das Eleições que prestigia a autonomia partidária prevista no art. 17, § 1º, da Constituição Federal é aquela que assegura, na propaganda eleitoral, idêntica liberdade na formação das coligações, sob pena de se verticalizar a propaganda eleitoral.
II - Consulta conhecida e respondida positivamente apenas em relação ao oitavo questionamento, quanto aos demais, não conhecida.
No mesmo caminhar, por meio da RP nº 2391-70, da Relatoria do Ministro Henrique Neves, na sessão de 01 de setembro de 2010, a Corte Eleitoral confirmou o entendimento citado:
Os precedentes deste Tribunal e as resoluções que tratam da matéria foram tomados em uma situação na qual havia identidade entre as coligações nacionais e as regionais em razão do que se apelidou de verticalização.
Atualmente, por força da Emenda Constitucional 52, não há mais aquela simetria e as divergências entre os apoios nacionais e as disputas estaduais são frequentes.
A Lei 12.034, de 200, além de introduzir o art. 53-A acima, também contemplou uma nova regra, adicionando o § 6º ao art. 45 da Lei 9.594/97:
§ 6o É permitido ao partido político utilizar na propaganda eleitoral de seus candidatos em âmbito regional, inclusive no horário eleitoral gratuito, a imagem e a voz de candidato ou militante de partido político que integre a sua coligação em âmbito nacional.
Esse dispositivo, que foi recentemente debatido por este Tribunal ao responder a Consulta 64740, não deixa dúvidas da possibilidade da vinculação entre a candidatura nacional e as candidaturas regionais. Como não há candidatura nacional que não seja majoritária, pois há apenas uma eleição nacional – a presidencial – a interpretação sistemática e simultânea dos artigos 4, § 6º e 53 – A da Lei das Eleições resulta na permissão para que os candidatos nacionais participem da propaganda estadual das eleições majoritárias, mas se abstenham de interferir nos espaços das candidaturas proporcionais, senão para prestarem apoio.
Por fim, reafirmando os entendimentos anteriormente expostos, o Tribunal Superior Eleitoral, por meio do Recurso Especial Eleitoral nº 1136-23.2010.6.02.0000, oriundo do Estado de Alagoas, promoveu a seguinte decisão:
ELEIÇÕES 2010. PROPAGANDA ELEITORAL. UTILIZAÇÃO DE NOME DE CANDIDATA À PRESIDENCIA DA REPÚBLICA E DO ATUAL PRESIDENTE EM JINGLE DE CANDIDATO AO GOVERNO DO ESTADO DE ALAGOAS. SUPOSTA INCOMPATIBILIDADE PARTIDÁRIA. INAPLICABILIDADE DO ART. 45, § 6º C\C O ART. 54 DA LEI Nº 9.504\97. RESPOSTA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL À CONSULTA 647-40\2010. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
A decisão suso referida é de imprescindível referência, uma vez que a demanda analisada pelo Tribunal Superior Eleitoral é exatamente a mesma analisada pelo presente parecer.
Na ocasião, o PTB lançou candidato próprio para a disputa ao Governo do Estado de Alagoas, o Sr. Fernando Collor de Mello, e na circunscrição estadual efetuou uma coligação com o PT. Todavia, em nível nacional o PTB se coligou com o PSDB, apoiando a candidatura do Sr. José Serra na disputa pelo cargo de Presidente da república.
O Sr. Fernando Collor de Mello utilizou em sua propaganda eleitoral a imagem e a voz do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva e da Sra. Dilma Rousseff. Na ocasião, a coligação de oposição em nível estadual questionou tal atitude, pois – segundo sua interpretação – a Lei Eleitoral vedaria as referidas participações em virtude de que o PTB e o PT encontravam-se em lados opostos na circunscrição nacional.
Levado a se pronunciar sobre o tema, o Tribunal Superior Eleitoral entendeu pela possibilidade de que os candidatos ao pleito nacional participem da campanha estadual, posto que inexiste verticalização partidária e, consequentemente, verticalização na propaganda eleitoral.
Ante o exposto, não há qualquer impedimento legal à formalização de uma coligação entre o PTB e o PT para a disputa ao Governo do Estado de Pernambuco. Também não há qualquer vedação para que o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva e a Sra. Dilma Rousseff, bem como quaisquer outros candidatos ou militantes filiados aos partidos coligados na circunscrição estadual, participem da propaganda eleitoral nas eleições do corrente ano no Estado de Pernambuco.
É o parecer.
Recife (PE), 26 de junho de 2014
PEDRO DE MENEZES CARVALHO
OAB/PE 29.199
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco
Professor Universitário
Membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/PE